segunda-feira, 14 de maio de 2012

Muro das Lamentações


Depois das emoções da minha despedida do futebol, estou de volta às crónicas, desta vez para falar de uma realidade que é bem conhecida de todos nós. As lamentações. Sim, porque os portugueses são campeões do Mundo das lamentações. A lamentar é que no entendemos. Querem ver?

Foi publicado há dias um estudo que visava medir a confiança e a felicidade dos portugueses. Até aqui tudo bem, seria mais um daqueles estudos para encher chouriços. Mas não. Nós somos mesmo os campeões do lamento. Somos tristes, infelizes, egoístas e deprimidos. E pergunta o leitor desse lado: 'Porquê?'. Pois bem, desde tenra idade somos criados e educados numa cultura de lamentação, onde só se vê o lado negativo das coisas. E isso cansa-me, faz-me queda de cabelo e dá-me vontade de agredir as pessoas. Querem ver uma listinha de lamentações para matar a curiosidade?

- 'Ahh, que porcaria de tempo, não chove e isso é muito mau para a agricultura'
- 'Ahh, que porcaria de tempo, não pára de chover! Isto só vai estragar as plantações!'
- 'Ahh, que os combustíveis não param de aumentar!'
- 'Ahh, não posso mais com estas notícias da crise, da dívida pública, da Grécia e das Secretas!'
- 'Ahh, estes políticos não sabem o que dizem! Chulos!'
- 'Ahh, isto está uma pouca vergonha, no meu tempo não havia cá paneleiragem nem drogas! O Salazar havia de estar vivo!'
- 'Ahh, não posso com a tromba da minha vizinha. E da minha sogra. E da minha cunhada. E da minha mulher. E do meu patrão.'
- 'Ahh, coitado de mim, vou ter que passar a trabalhar para receber o RSI!'
- 'Ahh, que a televisão está cheia de maricas, de gajas artificiais, de publicidade e de filmes rascas!'
- 'Ahh, o Benfica não ganhou, cabrão do árbitro!'
...

Sei lá, há tantos lamentos característicos dos portugueses, que sou forçado a referir apenas estes para não me alongar muito. Sou apologista de que cada casa portuguesa deveria ter um Muro das Lamentações, como aquele que há em Jerusalém. Assim dávamos trabalho ao pessoal da construção civil, que bem precisa. Acordávamos de manhã, lavávamos a cara e íamos fazer as nossas lamentações para a sala de estar. Qual pequeno almoço, qual quê. Somos bons é nisto. Se existisse um Campeonato do Mundo de Lamentações, ficaríamos em primeiro lugar, certamente.
Queixamo-nos de tudo. E de nada. Mas esquecemo-nos de olhar para o nosso próprio umbigo. Não vou com a cara dessas pessoas e tento-me afastar o mais possível delas. Têm aquele ar de quem já não fazem sexo há 9 meses, por exemplo. À mínima coisa, a barraca explode. E por norma, saem umas lágrimas para dar gosto à coisa.

Há muito boa gente a quem uma estalada na cara faria bem, porque não podemos passar a vida toda no marasmo. Preferimos ser infelizes, em vez de irmos em busca de um caminho que nos traga felicidade. É de lamentar.
Nunca a palavra 'crise' foi tantas vezes pronunciada nos últimos dois anos. Ela existe, mas sobretudo dentro da cabeça das pessoas. Uma bela crise de valores, que nos faz lamentar a toda a hora.
Qual a solução para este mal? Simples. Desliguem a televisão à hora do jornal da tarde e da noite. Leiam mais jornais e oiçam mais rádio. Procurem mais informação para sustentar as vossas críticas, quer elas sejam construtivas ou destrutivas. Trabalhem mais, invejem menos os familiares e os amigos, saiam mais de casa para desfrutar o nosso sol e as nossas praias. Estudem sempre que possível, façam desporto, dediquem-se ao voluntariado, promovam a cidadania todos os dias, respeitem o caminho que as pessoas querem seguir. 
Penso que somos demasiado fatalistas, e isso é bem patente na escrita do Fernando Pessoa e nas músicas da Mafalda Veiga. Se bem que o Fernandinho era um génio e foi capaz de assumir várias facetas, e a Paciência para o corte de pulsos da Mafalda já se acabou. É por isso que oiço muita música clássica, está explicado. Voltando ao fatalismo, temos que sair desta bruma teimosa que nos assola desde 1143, pois o momento que o país atravessa assim o exige. Já estamos fartos de utilizar os faróis de nevoeiro.

Os mais jovens não podem virar a cara à luta, porque o futuro de Portugal está nas suas mãos. E fartos de lamentos já andamos nós. Estudar, trabalhar, empreender e vencer. Acordar com a vontade de construir o nosso amanhã, aqui ou lá fora, mas preferencialmente cá dentro. Porque acredito sempre no lado positivo das pessoas e no valor que podem trazer à vida umas das outras. Basta pegar num martelo e partir cada tijolo do nosso Muro das Lamentações, para que possamos pavimentar o caminho do nosso sucesso.

Lamento, mas vou-me embora, porque o CD do Gustav Mahler acabou.

Valete Frates.

'Todos estão rodeados de oportunidades. Mas estas apenas existem quando são vistas. E apenas serão vistas se as procurarmos.' {Edward Bono}

Boas leituras,
GC

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