segunda-feira, 16 de abril de 2012

Ensino Superior... ou Inferior?


Depois de alguma ponderação, decidi escolher o estado do ensino em Portugal, na sua generalidade, como tema desta crónica. Por norma, costuma ser um tema bastante parecido com o Cozido à Portuguesa, algo indigesto e pesado, com a tendência para a libertação de gases. Para tornar a coisa mais ligeira, vou ser o mais breve possível na minha exposição. Vamos a isso!

Há uns tempos atrás, estava a almoçar com a televisão sintonizada naquele programa matinal da TVI que é apresentado por duas pessoas estridentes, e o convidado da última parte (geralmente, nesta parte do programa fala-se de homicídios, violações, roubos, tudo aquilo que podemos encontrar no Correio da Manhã) era o bastonário da Ordem dos Advogados, Marinho Pinto. E o tema versava sobre a taxa de reprovação de alunos de Direito ao exame da Ordem (59% de chumbos), argumentando que as universidades estavam mais preocupadas com a 'mercantilização' do ensino do que propriamente com a qualidade do mesmo. E por mais estranho que pareça, concordei com o que o bastonário tinha acabado de dizer.
O ensino em Portugal não está bem... e não se recomenda. Salvo raras excepções, e ainda bem que elas existem. A começar no ensino primário e acabando no ensino superior, precisamos de uma profunda reforma que traga mais qualidade e competitividade às nossas escolas. Mas também precisamos que a mentalidade de muitos pais seja capaz de evoluir, no sentido de imprimir exigência e responsabilidade nos resultados escolares dos filhos. 

Vivemos numa era de facilitismos, onde as crianças começam a mexer no computador aos 7/8 anos, mas são incapazes de fazer uma conta de somar mais complexa ou de articular diversas palavras. As crianças e jovens passam o tempo livre agarrados ao computador e à televisão em vez de andarem na rua a rasparem com os joelhos no chão, de abrir o queixo a andar de bicicleta, de raspar a cara no alcatrão depois de cair do skate ou cair de cara estampada no estrume, coisa que me marcou para toda a vida. Adiante.
Será que os testes, as provas intercalares e os exames têm o grau de exigência necessário para avaliar as competências dos alunos? Ou será que o facilitismo existe para embelezar as estatísticas da OCDE? Na minha opinião, penso que o ensino em Portugal está mal estruturado, pois os professores deveriam ter mais autonomia e autoridade sobre os alunos, e os alunos também deveriam corresponder com mais trabalho e melhores resultados. As pessoas têm que perceber que a escola e a formação são essenciais para o desenvolvimento sustentável do futuro de cada um de nós, pois um país será tanto melhor quanto maior for a sua taxa de licenciados. Podem-me chamar de 'populista' depois destes argumentos, e bem sei que 35% dos jovens licenciados estão no desemprego. Mas um desempregado licenciado tem mais probabilidade de arranjar trabalho do que uma pessoa só com o ensino secundário. Já para não falar do nível de remunerações, que se acentua consoante o nível de formação.

Não podemos ter 30 cursos de Direito em Portugal, não podemos fazer advogados em 3 anos, não podemos formar arquitectos só porque é giro, não podemos tornar o ensino numa debandada sangrenta do capitalismo (agora parecia o Jerónimo de Sousa a falar, mas tirem o cavalinho da chuva). Há excesso de advogados, de arquitectos, de psicólogos, de sociólogos, de historiadores, de antropólogos, de economistas... e os nossos jovens na hora de escolherem o curso superior, vão completamente às cegas, passando a si mesmos um atestado antecipado para o desemprego. A escolha da área de especialização do 9º para o 10º ano e do 12º para o ensino superior é fundamental na vida dos jovens. É preciso perceber quais são os sectores da economia que absorvem mais trabalhadores qualificados, quais são as taxas de desemprego entre os mais jovens e que cursos são mais penalizados e tentar delinear as perspectivas futuras. Cada um tira o curso que quer, onde se sinta mais à vontade, e se é realmente aquilo que a pessoa gosta de fazer, não a posso condenar. Mas geralmente, o futuro fica como as pensões dos nossos contribuintes, congelado. Áreas mais técnicas, como as engenharias, contabilidade, gestão, biologia, medicina, etc, são por norma favoráveis aos recém-licenciados. Mas com a venda indiscriminada de cursos por tudo o que é lugar, o nome da universidade pode ter um peso decisivo na hora das empresas recrutarem.

No ISCTE-IUL, por exemplo, tem sido feito um esforço hercúleo para articular as empresas com a universidade, nos mais variados cursos. A realização de feiras de emprego e de palestras é importante para os jovens percepcionarem o mercado laboral, podendo sentir de uma forma mais pessoal o contacto realizado com os possíveis empregadores. São iniciativas como estas que podem contribuir para um novo olhar sobre o futuro, numa hora em que este nevoeiro milenar teima em não sair de Portugal.
Não vou mencionar pessoas ou gerações à rasca, porque o meu objectivo é chamar a atenção das pessoas para uma formação adequada ao longo do percurso escolar, onde devemos primar pelo rigor, exigência e responsabilidade de todos os intervenientes. Tive a felicidade de ter tido excelentes professores, alguns dos quais são actualmente meus amigos, porque sempre respeitei a profissão deles, que admiro bastante, e também pelo facto de terem aturado o meu mau feitio matinal. E ainda recebo mensagens de Natal e de aniversário de professores meus. É esta a relação que todos deveríamos ter com a escola, receber formação, mas acima de tudo, receber a amizade e o respeito de colegas e professores.

Não me vou estender muito mais, pois este tema é indigesto, como tinha dito lá em cima. Remato, dizendo que nunca devemos descurar a formação e que os nossos jovens devem ser melhor aconselhados na hora de escolher um curso superior. Ah, e que não nos devemos eximir de responsabilidades, pois só um ensino de exigência, de qualidade e que promova a meritocracia poderá tornar Portugal num país mais próspero e menos fatalista, como aqueles programas matinais da televisão.
Está na hora de sair do nevoeiro!

'Se deres um peixe a um homem faminto, vais alimentá-lo por um dia. Se o ensinares a pescar, vais alimentá-lo toda a vida.' {Lao-Tsé}

Boas leituras,
GC

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