sexta-feira, 24 de agosto de 2012

O Estado do Desporto em Portugal

Forrest Gump Vs Usain Bolt

Andando ao sabor das ondas do Verão, o meu ritmo de publicações é deveras mais baixo do que noutras alturas do ano, como já devem ter reparado. Desde já peço desculpa, mas é mais forte do que eu! Hoje venho-vos falar de desporto, depois da euforia olímpica ter acalmado um pouco. A prestação dos nossos atletas em Londres, o estado do desporto em Portugal, a prática de modalidades... calcem uns ténis confortáveis, metam uns phones nos ouvidos e sigam comigo.

Segui com alguma atenção o desempenho dos nossos atletas nos Jogos Olímpicos que se realizaram em Londres. Obviamente que a maior desilusão veio da Telma Monteiro, porque havia ali uma certa expectativa gerada pelos sucessos mais recentes da atleta. Os dias iam passando e eu só via atletas portugueses a serem eliminados. Até que veio uma pequena alegria através do ténis de mesa, com uma excelente prestação dos nossos pupilos, e a alegria maior preconizou-se com a conquista da medalha de prata na canoagem, por Emanuel Silva e Fernando Pimenta. Uma medalha somente, em dezenas de atletas que foram até à capital inglesa.
Longe vão os tempos em que o atletismo nacional trazia grandes alegrias ao povo, que ficava colado ao ecrã, à espera que o Carlos Lopes, Rosa Mota ou a Fernanda Ribeiro cortassem a meta. De vez em quando, a nível europeu, lá fazemos umas graçolas, como a Jéssica Augusto ou a Dulce Félix. Hoje em dia, os índices de competitividade estão bastante elevados, o que nos faz correr atrás de países inimagináveis, tais como a Etiópia, Eritreia, Quénia, Qatar, etc. E eu pergunto: então não temos as condições de treino necessárias para alcançar o sucesso? Temos, sim senhor. Portugal tem excelentes instalações desportivas, nomeadamente centros de alto rendimento (Rio Maior, Caldas da Rainha, Sangalhos), parques desportivos, pavilhões e faculdades. Basicamente, temos os ingredientes todos, mas é como se estivéssemos a cozinhar de olhos vendados. 
Acredito nas capacidades do nosso capital humano, mas devido ao nosso fatalismo/sebastianismo faltará sempre algo. Aquela pontinha de sal ou de pimenta, ou seja, mais esforço, sacrifício e dedicação. É muito bonito quando se diz: 'ahhhhh, já é uma vitória estar aqui presente'. Exacto, os contribuintes irão dizer a mesma coisa, certamente, já que as bolsas do COP foram pagas com o dinheiro de todos nós.
Choca-me sobretudo o facto dos atletas paralímpicos obterem melhores resultados e não receberem o devido incentivo e reconhecimento. Supostamente deveria haver equidade, mas estamos num país onde é mais bonito enviar areia para os olhos...

Quando dizem que o Estado deveria apoiar mais os atletas, subsidiando as condições de treino e afins, digo-vos uma coisa tão simples como esta: no Brasil, grande parte dos atletas olímpicos são patrocinados por empresas privadas. E esta, hein? Porquê que a GALP, EDP, PT, Jerónimo Martins, SONAE e demais empresas cotadas não criam uma espécie de mecenato desportivo para apoiarem os nossos atletas? Os pilotos de rali, especialmente o Armindo Araújo e o Carlos Sousa, não andam agarrados à perna do Estado para ver se cai um subsídiozinho, por exemplo. O Tiago Pires anda à boleia da QuickSilver, mais um exemplo. Estão a ver onde quero chegar? Temos que ser mais ambiciosos e deixarmos de lado a pequenez que tanto nos caracteriza.
Penso que o estado do desporto em Portugal não é de todo saudável, sobretudo num país onde somos bombardeados com futebol 24 horas por dia, em todos os meios de comunicação social. Então e o basquetebol, voleibol, râguebi, hóquei em patins, atletismo, ciclismo, etc? Não é com o programa Desporto2, que passa na RTP2, que vamos resolver as disparidades do desporto nacional. Existe vida para além do futebol. E olhem que eu pratiquei esta modalidade durante 6 anos e estive mais 3 ligado às suas andanças. 
Felizmente, ainda há muitas pessoas que praticam desporto em Portugal, não tantas como o desejável, mas que mesmo assim são os representantes de muitas instituições e clubes. Somos bons na patinagem, ciclismo, canoagem, ténis de mesa, atletismo, orientação... e muito mais.

O Estado deveria apresentar uma maior ênfase no desporto escolar, pois é aqui que está o segredo para o sucesso em várias modalidades. Nos países de Leste, nórdicos e Estados Unidos, desde cedo que as crianças são motivadas para a prática desportiva. Não é por acaso que os EUA foram o país com mais medalhas conquistadas nos JO2012, a Rússia em 4º e a Alemanha em 6º. São obviamente países com uma escala de recrutamento infindável, pormenor esse que faz toda a diferença. Em Portugal, o que se fez? A Educação Física vai deixar de contar para a média escolar. Ao mesmo tempo, foi publicado um estudo onde se diz que as crianças e jovens que praticam desporto são aquelas que obtêm os melhores resultados escolares. Será preciso dizer mais alguma coisa? Depois não se venham queixar do número crescente de crianças obesas, presas no seu sedentarismo, que custam milhões de euros/ano ao Serviço Nacional de Saúde. Qual será a motivação dum aluno sabendo que aquela disciplina não irá contar para a média final? A pessoa que teve esta peregrina ideia nunca deve ter saído da sua secretária no Ministério da Educação.
A Educação Física deveria contar para a média, com uma maior carga horária semanal (para quê disciplinas como Formação Cívica e Estudo Acompanhado? Formação Cívica aprende-se em casa com os pais!) e com a exploração de mais modalidades. Obviamente que nem todas as escolas têm as condições estruturais e humanas para implementar esta medida, porque mexe-se com horários dos professores e disponibilidade dos espaços físicos. Mas se continuar tudo na mesma, continuaremos na mediocridade.

Nem tudo é mau, pois também existem situações positivas que se reflectem na sociedade. Vejo cada vez mais pessoas com hábitos saudáveis, sobretudo no âmbito desportivo. Na minha área de residência, é cada vez mais comum ver pessoas a fazer o seu jogging ou a mandar umas pedaladas na bicicleta. Há muitas crianças e jovens inscritos nos clubes de futebol da zona, o que é assinalável. No meu caso particular, prefiro fazer o meu jogging e dar uma voltas de BTT com os melhores amigos, porque não consigo ficar muito tempo sem praticar desporto. Vejo também na televisão o número crescente de pessoas que vão a maratonas ou ao BikeTour, nem que seja só pelo convívio. Ou que os ginásios estão cheios. É um sinal de que as pessoas querem redefinir os seus hábitos, em busca de satisfação e de bem estar físico e psicológico.

No fundo, a prática desportiva traz imensos benefícios, sobretudo se for fomentada desde tenra idade. Permite criar uma cultura de responsabilidade, de autonomia, de trabalho em equipa (no caso das modalidades colectivas), capacidade de superação e aprender a lidar com a vitória, mas sobretudo com a derrota. Estes aspectos são fundamentais para o desenvolvimento cognitivo e da personalidade de cada um. Como já referi anteriormente, é imperativo alterar a cultura desportiva em Portugal e descentralizar o foco que existe à volta de certas modalidades, em prol de tantas outras. O desporto escolar deve ser um veículo para a criação de atletas de excelência, que permitam alcançar o sucesso desportivo. Fazer uma carreira desportiva no nosso país pode parecer um suicídio, dadas as dificuldades. Mas são muitos aqueles que o fazem por gosto e que adoptam a filosofia de vida que o desporto oferece.

Pode ser que no Rio de Janeiro2016 as coisas sejam melhores, porque nós temos sempre aquela velha mania: amanhã é que vai ser! Agora que cortei a meta do meu texto, vou ver a etapa da Volta a Portugal, pois esta não é a minha vida! E boa sorte para os nossos atletas paralímpicos, em Londres.

'Necessitamos sempre de ambicionar alguma coisa que, alcançada, não nos torna sem ambição.' {Carlos Drummond de Andrade}

Boas leituras,
GC

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